Tudo mudou desde o surgimento do novo Coronavírus no mundo. O distanciamento social é a principal medida recomendada por especialistas para achatar a curva de contágio pelo vírus e evitar a sobrecarga do sistema de saúde. No Brasil, a situação não é diferente e milhares de cidadãos estão sendo impactados.
Em espaços como condomínios, as regras de convivência e segurança precisam acompanhar as mudanças para atender as novas necessidades dos moradores.
Para falar sobre gestão da segurança condominial e as mudanças trazidas pela Covid-19, convidamos Eytan Magal, CPP, Consultor Master de Segurança e Gestão. Ele revela como os condomínios precisam se estruturar e qual sua opinião sobre o principal legado que será deixado pela pandemia.
Confira a entrevista completa
O que mudou nas regras de segurança dos condomínios com o surto de Covid-19?
Aconteceu o seguinte, todo mundo está confinado, todo mundo está fechado e essa situação impactou em alguns processos. O entra e sai de veículos e pedestres reduziu bastante. O impacto principal foi a questão das entregas, desde compra nos supermercado, delivery, etc.
Todo este processo de compras refletiu num aumento muito significativo na demanda da portaria. A grande preocupação é quando pessoas com intenções criminosas se aproveitam deste grande fluxo de atividades para adentrar nos condomínios.
Houve um caso semana passada em que os meliantes sequestraram um entregador do Ifood e foram fazer a entrega no lugar dele e, dessa forma, conseguiram entrar no condomínio. Essa nova realidade nos traz novas vulnerabilidades. Por isso mesmo, os condomínios tem que se preparar bem para saber responder a este tipo de vulnerabilidade.
Quais regras devem ser instituídas diante disso? O que você acha que tem que mudar na questão de segurança diante dessa realidade?
Mudar não, nortear. Como falei antes, a questão de autorização para entrada de algum visitante ou prestador de serviços está dentro dos procedimentos preestabelecidos para o morador. Tem um condomínio que, devido a este tipo de ocorrência que acabei de mencionar, passou a pedir aos moradores que, ao realizarem a compra, peçam o nome e RG da pessoa responsável pela entrega. Agora, isso é difícil de implementar, porque a gente sabe que quando se compra pelo aplicativo, não se sabe quem vai entregar as mercadorias. Se você compra um produto pelo Mercado Livre, por exemplo, você não tem essas informações. O entregador vem, bate na porta e entrega. Então, isso nos traz uma certa preocupação.
O correto é não deixar a pessoa entrar e impedi-la de passar pelo portão. Se a encomenda for grande, deixar na clausura e o porteiro fica responsável por trazer para dentro. Tem condomínios que tem um espaço, chamado de entrega direta, onde o entregador fica do lado de fora e o morador do lado de dentro. Por meio de uma abertura dentro desse limite, seja uma grade ou um portão fechado, o morador recebe a encomenda.
Além dessas questões de barreira física, quais tecnologias aplicadas à segurança dos condomínios você acredita que fazem a diferença no momento e devem se perpetuar?
A questão não é implantar uma nova tecnologia nesse momento, principalmente porque ninguém implanta tecnologia em um ou dois meses. Se não houver um planejamento prévio, não há condição de atualizar a estrutura de segurança. Principalmente porque, às vezes, é necessário fazer adequações físicas, alterar layout, arquitetura.
Hoje, um condomínio que não tem nada, como deve começar este processo?
Primeiramente, precisamos fazer a análise de risco para determinar qual o nível de segurança do condomínio e quais os recursos necessários para desenvolver o que chamamos de SIS (Sistema Integrado de Segurança).
Uma vez levantados os recursos necessários, como recursos humanos, técnicos (físicos e eletrônicos) e organizacionais (toda parte documental), entregamos um documento com as recomendações para o síndico e sua comissão aprovarem, contendo o custo estimado do investimento e os procedimentos necessários para adequar a segurança do condomínio.
Depois que isso é consolidado, vai à assembleia para ser votado, porque terá que ser combinado entre os moradores. O síndico tem que ter aprovação expressa dos moradores ou seus representantes.
Atualmente, em meio à pandemia, fazer uma assembleia é algo inviável. Em vista disso, a assembleia digital pode ser uma alternativa, respeitando o que foi dito acima.
Caso não seja possível, precisará se manter com aquilo que tem, fazer manutenção nos sistemas para ver se tudo está funcionando, muito treinamento com os porteiros, fiscalização e tentar sobreviver nesse momento tão crítico que estamos passando.
[Leia mais sobre tecnologia para administração remota de condomínios e assembleias virtuais aqui no Blog da Segurança]
Como você enxerga que esses condomínios mais estruturados estão neste momento? Qual que é a respostas deles? As tecnologias dão o suporte necessário que eles precisam agora?
Cada condomínio tem que fazer sua lição de casa. Cada um deve fazer o inventário de todos os equipamentos, verificar se tudo está funcionando, se as câmeras estão gravando, se o botão de pânico está chegando à empresa de monitoramento, se a cerca elétrica está funcionando. O pessoal deve receber uma certa reciclagem de conteúdo, pois o recurso humano é o recurso mais falho, mais difícil para você fazer a gestão.
Todos devem estar alinhados com o conhecimento. As empresas prestadoras de serviço, sendo a equipe terceirizada pelo condomínio, precisa fazer o papel dela muito fortemente, pois a responsabilidade no final do processo é dela também. O síndico tem a responsabilidade civil e criminal, mas sem equipe, sem processos ou sem recursos, ele não consegue efetivar a segurança. Não é o síndico que está na portaria.
A questão da comunicação é muito importante para que tudo funcione. Como você diria que é uma comunicação efetiva no caso de sinistros em condomínios bem estruturados?
O processo de gestão de comunicação é um dos fundamentos mais importantes da segurança condominial porque, infelizmente, a cultura brasileira tem muita emoção. As pessoas se influenciam muito facilmente por qualquer tipo de informação de fora, isso acaba abrindo espaço para brechas na segurança.
Em um momento de ocorrência, a comunicação tem diferentes estágios. Uma coisa é quando acontece a ocorrência em si, que deve ser tratada de imediato, devem existir ações para minimizar os danos e quanto mais rápido forem executadas, melhor. Depois do ocorrido, geralmente o correto é fazer o condomínio se unir. O síndico se unir com o conselho e emitir um comunicado, bem curto, objetivo, respondendo o 5W-2H para os moradores do condomínio.
Quanto maior o condomínio, em termos de unidades e moradores, mais complexa e mais importante a comunicação. Um dos grandes inimigos da gestão de segurança são as redes sociais, pois as pessoas começam a postar informações sem muito fundamento, no “achômetro”, por meio de boatos. Isso causa mais alarde e complica mais ainda a situação.
Ou seja, quanto antes você consegue organizar e divulgar a informação de forma clara e objetiva, seja por documento, áudio ou vídeo, até na ponta, que é o morador, você consegue ter mais controle no processo de solução do problema e pode começar a fazer gestão da crise.
Hoje existem aplicativos específicos para gestão da comunicação, onde toda a gestão condominial pode ser feita por smartphone, ferramenta cada vez mais presente nos condomínios, principalmente nos grandes. Desta forma, você pode informar qualquer anormalidade ao porteiro e/ou síndico, receber informações e agir em casos de ocorrências. Temos meios e hoje é muito mais fácil se comunicar..
Você acha que alguma coisa vai mudar drasticamente durante a pandemia e, quando ela se estabilizar e a crise passar, você acredita que alguma coisa será divisor de águas em gestão de segurança de condomínios?
A gente quer quebrar paradigmas todos os dias. Mas, existe um desafio aqui, porque segurança condominial começa na arquitetura certa. Se a arquitetura não beneficia a segurança, ela sempre será prejudicada. A segurança eletrônica vem depois, complementando uma arquitetura que beneficie a gestão da segurança.
Nós fazemos constantemente um trabalho com incorporadoras, para conscientização que a segurança patrimonial é um projeto complementar numa edificação, de forma a corrigir alguns projetos arquitetônicos e permitir um sistema integrado de segurança. Por exemplo, colocando a portaria em um ambiente favorável, prever clausuras para pedestres e veículos, separação de entradas de serviço e social, etc..
Pensando em termos de quebra de paradigma após o surto de Covid-19, uma coisa que vai mudar é o controle de acesso aos condomínios. Existem condomínios residenciais que ainda não têm sistemas adequados. Possuem sistemas de cadastros, mas não são sistemas de controle de acesso. Existirá uma atenção maior nessa questão em conjunto com a questão do treinamento de pessoal.
Também acredito que pessoas vão ficar mais atentas às questões de convivência, porque mais gente vai ficar mais em casa e os condôminos vão ter que saber conviver mais uns com os outros. Essa é uma grande dificuldade. Você mal conhece seu vizinho, mas agora as pessoas vão começar a circular mais dentro dos condomínios, por isso é muito importante ter regras muito claras a respeito de convivência.
Nós sugerimos sempre que existam regras que sejam claramente escritas e aprovadas pela assembleia, pois se tratam do regulamento interno do condomínio. No chamado Guia de Convivência Social são definidas todas as normas que o morador tem que seguir dentro do ambiente que está morando. Sem regras, não tem como padronizar os procedimentos, cada um utiliza seu próprio padrão, podendo haver muito problema nesse sentido.
Principalmente o porteiro e a equipe de segurança devem saber exatamente o que fazer em cada tipo de situação. O morador também tem que saber as regras. A gente começa nosso guia falando dos 10 mandamentos que o morador tem que seguir dentro do condomínio. Isso é fundamental. Sem essa clareza para todos os envolvidos, o síndico, o administrador, não têm como atuar com muita efetividade.
Sobre Eytan Magal:
Israelense naturalizado Brasileiro. Serviu no exército israelense até a patente de Capitão no posto de subcomandante de batalhão de infantaria. Formado pelos órgãos de segurança de Israel, chefiou a segurança de entidades diplomáticas na Bolívia e Brasil.
Possui diversos cursos na área de segurança empresarial e gestão de pessoas no Brasil e no exterior.
Atuou por 17 anos como Gestor da Segurança Pessoal e Empresarial do Grupo Suzano.
É sócio fundador e diretor da ABSEG (Associação Brasileira de Profissionais de Segurança) e certificado pela ASIS International (American Society for Industrial Security) como CPP (Certified Protection Professional), a maior certificação internacional de segurança.
Atualmente é Consultor Master de Segurança e Gestão.